Transplante de medula: a corrente do bem

“É uma pequena ação que se pode transformar em algo maior e não custa nada”: foi assim que um dador voluntário de medula óssea definiu o processo que, em alguns casos, é capaz de salvar uma vida. Trata-se, sobretudo, de uma das expressões máximas da força de carácter, solidariedade e empatia, até porque, em Portugal, os protocolos oficiais não permitem que os dadores saibam quem são os recetores. Faz-se o bem – e que grande bem! – sem se saber a quem.

 

E não são poucos os portugueses que se dispõem a doar a sua medula. O total de voluntários registados ultrapassa os 400 mil (61% mulheres e 39% homens), perto de 5% da população do país, que é o terceiro na Europa neste ranking honroso. Do outro lado, porém, cresce o número de pessoas que necessitam de transplante de medula, por serem portadores de alguma doença que, na maior parte, relaciona-se com o sangue, sendo a leucemia a mais frequente. 

 

O transplante de medula é indicado em casos de doenças hereditárias do metabolismo e de mau funcionamento do sistema imunitário, que acometem principalmente crianças. A maior probabilidade, portanto, é que mesmo sem saber quem é o recetor, o dador beneficie uma criança. A medula óssea é vida no seu estado puro, e talvez você possa ser um dador. 

 

De acordo com o Serviço Nacional de Saúde, o candidato deve ter entre 18 e 45 anos, no mínimo 50 kg e 1,50 m de altura, ser saudável e não ter recebido nenhuma transfusão de sangue. Para se inscrever basta preencher o inquérito do Registo Português de Dadores de Medula Óssea e, caso seja considerado apto, dirigir-se ao local onde se fará a colheita de uma amostra de sangue. Existem no país vários locais de inscrição, que podem ser conhecidos no site da Associação Portuguesa Contra a Leucemia.

 

Antes disso, porém, saiba o que é a medula óssea e como se processa um transplante. Resumidamente, a medula é um tecido líquido-gelatinoso onde estão presentes as células progenitoras, que têm a capacidade de dar origem a outras células no sangue periférico. Localizada no interior dos ossos, como os da bacia, a medula desempenha um papel fundamental no desenvolvimento das células sanguíneas, como local de produção dos leucócitos (glóbulos brancos), hemácias (glóbulos vermelhos) e plaquetas. 

 

Os leucócitos são os principais agentes do sistema de defesa do organismo e protegem-nos contra as infeções, enquanto as hemácias transportam o oxigénio dos pulmões para as células de todo o organismo. As plaquetas, por sua vez, compõem o sistema de coagulação do sangue. Desta forma, é a medula que concentra o processo de renovação do sangue. Não se pode confundi-la com a medula espinhal, que fica na coluna vertebral e tem a função de transmitir para o corpo os impulsos nervosos do cérebro.

 

No transplante, o dador cede ao recetor uma parte da sua medula óssea sadia para substituir uma que está doente ou com deficiência de células normais. Desta maneira, o recetor consegue reconstituir a sua medula, torná-la saudável e curar-se da doença que o acomete – é como um pequeno milagre.

 

Para que ocorra o transplante, é necessário que o dador e o recetor sejam compatíveis, o que é verificado através de exames de sangue e outros testes clínicos. A transplantação consiste na administração de células hematopoiéticas pluripotentes colhidas na medula. Essas células são capazes de se dividirem e de se auto-renovarem, e quanto mais o dador for compatível com o recetor, maiores são as probabilidades de obter bons resultados.

 

O primeiro transplante de medula óssea em Portugal ocorreu em maio de 1987, no Centro de Lisboa, no Instituto Português de Oncologia de Francisco Gentil. Passados mais de 30 anos tudo mudou, o procedimento ganhou destaque e formou-se uma brigada de dadores voluntários, com um número crescente. Mas nem sempre é fácil. Segundo a Associação Portuguesa Contra a Leucemia, pode ser necessário pesquisar centenas de milhares de dadores até que se encontre um perfeitamente compatível com o recetor. Por isso, é normal analisar, em primeiro lugar, um irmão do paciente – um em quatro irmãos é compatível.

 

Anualmente, são registados em Portugal cerca de mil novos casos de leucemia, sem contar as outras doenças que podem ser curadas através de um transplante de medula. Por tudo isso, apesar da boa situação portuguesa em comparação com outros países, os especialistas enfatizam sempre a necessidade de mais e mais dadores, para que se consolide uma verdadeira corrente do bem, da qual você pode ser um dos elos.

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